Qual a relação entre uma manchete de jornal e o texto de uma lei? Em que medida o clamor público, amplificado pela mídia, pode moldar o sistema penal de uma nação? Nesta obra, Mariana Colucci Goulart Martins Ferreira desvenda a complexa e perigosa intersecção entre o espetáculo midiático e o Direito Penal no Brasil. A análise expõe criticamente como a pressão social, impulsionada pelo sensacionalismo em torno de crimes chocantes, induz o legislador a forjar leis cada vez mais rígidas, em um reflexo direto de movimentos como a “Lei e a Ordem” e a “Tolerância Zero”.

O fio condutor da análise é a Lei de Crimes Hediondos (Lei n. 8.072/90). A autora demonstra que tanto a sua criação quanto as suas sucessivas modificações não foram meros acasos legislativos. Pelo contrário, cada etapa surgiu na esteira de “casos de grande repercussão”, espetacularizados pela imprensa desde os sequestros de empresários que deram origem à lei, passando pelo assassinato da atriz Daniella Perez, que levou à inclusão do homicídio qualificado, até o escândalo das “pílulas de farinha”, que adicionou crimes contra a saúde pública ao rol. A obra revela como o agravamento de penas – através de uma afronta a princípios basilares do Estado Democrático de Direito, como a dignidade humana e os direitos fundamentais, que deveriam ser a matriz de todo o sistema penal – é apresentado como uma solução mágica para a criminalidade, funcionando como um “sedativo” para uma sociedade amedrontada.

“Entre a Lei e o Espetáculo: dignidade humana, direitos fundamentais e crimes hediondos no contexto midiático” é uma reflexão sobre os riscos de uma legislação penal que responde mais ao pânico do que à razão. E também é um convite para questionar se estamos construindo um sistema de justiça mais eficaz ou se trata apenas de um reflexo de nossos medos, moldado pela disputa incessante por audiência.